Peço licença aos que me leem sempre para que, nesse Dia do Professor, transcreva o poema “Canoeiros” do meu saudoso avô, Kosciuszko Barbosa Leão(foto), professor, jurista, filósofo, escritor, Membro Emérito da Academia Espiritossantense de Letras, publicado neste dia, há exatos 60 anos no Jornal Correio da Manhã, em homenagem aos professores brasileiros. Pra mim, a obra prima do meu avô.
CANOEIROS
Ó canoeiro, que vais e que vens nesse rio, / Ou de dia ou de noite, ao sol, à chuva, ao frio / De margem para margem! / Canoeiro da passagem, / Em teu rio, que corta / O caminho e interrompe o passo aos peregrinos, / És no destino, igual à chave de uma porta. / És a chave, que abre a porta dos destinos.
Sem os teus temos, sem / Tua brava canoa / E o teu braço valente a tua mão tão boa, / Impossível passar destas margens além. / É um abismo esse rio, em que o viajor trasladas. / Há tantos rios sempre, assim, pelas estradas! …
E, por isso, canoeiro, eu muitas vezes cismo / No infortúnio dos que, na estrada caminhando, / Não te encontraram mais, para a passagem, quando / Chegados, afinal, à margem desse abismo.
És, pois, a condição da marcha e, todavia, / Os passageiros teus / Mal te dizem adeus, / Depois da travessia.
E, se és tu, que a buscar mais passageiros, dizes / Adeus aos que se vão, mal ouves as respostas. / Jogam no teu chapéu uns níqueis e, felizes, / De novo a caminhar, voltam-te logo as costas.
Mas que importam, canoeiro, esses males que arrostas? / A tua glória está nessas margens, que ligas, / Duas margens opostas, / De que teu braço faz duas margens amigas.
Que te importa que fiques, / Por teu árduo labor, apenas c9m uns níqueis?
Ninguém leva o que é teu – o tecido de fronde, / Que circunda o teu rio, de onde em onde, / Os vivíssimos tons de uma rica paleta, / Não se sabendo ali, quando longe a canoa,
Se a borboleta é flor – um pétala que voa, / Ou se aflorada é ali cativa borboleta.
O teu pequeno mundo encerra o mundo inteiro. / Olha, eu sei de um canoeiro…
Ele é também, coitado, / Um pêndulo a oscilar, de lado para lado, / Entre as margens de um rio – uma espécie de ponte / Na estrada interrompida, / Para os que querem ir aos longos do horizonte, / Na jornada da vida.
Ama também, como amas. / Mas não tem, para amar, teus lindos panoramas. / E diferem, no mais, a sorte dele e atua. / Basta-te a vil migalha, / Que o passageiro atira ao teu chapéu de palha. / Tua camisa é livre e tens a espádua nua.
Mas nesse remador, teu traje humildo espanta. / É preciso mentir. / E ele usa uma gravata, / Que a garganta escraviza e é como um nó que o mata. / É um nó na garganta.
Tu tens a cabana / E aí tu és senhor, / Uma voz soberana. / Mas esse outro canoeiro é um simples remador, / Que mora na cidade e, em meio a tantas casas, / Muitas vezes não tem onde pousar as asas/ – Os seus remos, que são os remígios das almas, / Para os voos triunfais, que fazem toda a glória / Dos homens e, afinal, das pátrias, sob palmas, / Na universal e eterna aclamação da História.
Ó Pátria! Meu Brasil! Teu máximo operário/ É esse remador. / Bem vês, um proletário, / Ó Pátria, o professor.
Dedico “Canoeiros” à D. Zulmira Ferreira, minha 1ª professora, e aos meus mestres médicos Olívio Louro Costa, Evaldo D’Assumpção e Ivo Pitanguy.